Desenvolvimento sustentável e o sistema de freios e contrapesos

Após um período glorioso, em que o rei Luís XIV transformou a França em uma potência, os gastos excessivos com guerras, agravados com a sucessão que levou por Luís XV ao trono, fez com que surgisse a Revolução Francesa. Nesse período, baseado nas obras de Aristóteles e John Locke, Montesquieu escreveu “O Espírito das Leis”.

Com o claro objetivo de que governos absolutistas não voltassem ao Poder, o autor francês trouxe a ideia de que cada um dos três Poderes seria independente e autônomo, mas seria “controlado” justamente pelos outros poderes. Somente assim haveria harmonia entre eles. Era o chamado “sistema de freios e contrapesos”.

Passados muitos anos o Estado foi se aprimorando e criando órgãos de controle, com função precípua justamente de controlar a atuação desses três Poderes. Imaginava-se, assim, que cada Poder poderia exercer as suas funções sem extrapolamentos. Dessa forma a convivência seria harmoniosa e não ocorreriam intromissões indevidas.

Vindo para os dias atuais, deparamo-nos, especialmente nas questões relacionadas ao uso de recursos ambientais para a realização de atividades econômicas, com uma constante intromissão, data vênia, não só de um Poder sobre o outro, mas também dos órgãos que deveriam ser apenas de controle imiscuindo-se na atividade das entidades que formam o Sistema Nacional de Meio Ambiente. E isso faz com que as entidades que deveriam se dedicar ao licenciamento e fiscalização dessas atividades, acabem tendo que dedicar grande parte do seu tempo a cumprir requisições feitas por esses outros órgãos.

Em função dessa situação que o Estado de Santa Catarina, por exemplo, propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5982/18, requerendo que o Supremo Tribunal Federal declare ou a inconstitucionalidade ou a interpretação conforme a Constituição dos incisos II e III, do art. 8º, da Lei Complementar 75/93, que possibilita ao Ministério Público da União requisitar informações ou requisitar serviços temporários dos servidores da Administração Pública. Em alguns casos, o atendimento a essas requisições e às Recomendações expedidas pelo Ministério Público ocupa mais de 40% do tempo despendido pelos servidores dos órgãos ambientais.

Desnecessário fazer aqui elogios à atuação do Ministério Público. A instituição, especialmente após a Constituição Federal de 1988, prestou, presta e ainda prestará serviços imprescindíveis ao nosso país. Como fiscal da lei ou como autor de demandas civis e criminais, a entidade empreende um combate incessante à corrupção. De igual forma, garante o respeito aos direitos da coletividade e evita que transgressões ocorram. E age assim, e muitas vezes com acerto, também nas questões ligadas a uso e ocupação do solo ou à utilização de recursos naturais. Por isso, não se está no presente artigo simplesmente criticando a atuação do MP ou dos órgãos ambientais. Mas o que se pretende, apenas e tão somente, com base na leitura da ADI acima referida, que se proceda a uma reflexão.

Será que essas intromissões estão auxiliando esses processos de licenciamento ou estão atrasando, inviabilizando e gerando insegurança jurídica? Será que passados séculos da vinda da obra “O Espírito das Leis”, não está na hora de se refletir sobre a necessidade de que o sistema de freios e contrapesos funcione nas questões relacionadas ao licenciamento ambiental de obras utilizadoras de recursos naturais?

Por Marcos Saes

Publicado em: 20/08/2018

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