Quando a Constituição Federal elevou a defesa de um meio ambiente ecologicamente equilibrado a um preceito constitucional, todas as pessoas – e inclusive as futuras gerações – devem ter ficado felizes[1]. Dessa forma, a defesa das riquezas naturais foi elevada à mesma categoria, por exemplo, do direito de propriedade e da livre iniciativa. Dessa forma, quis o constituinte que esses princípios constitucionais coexistissem, ou seja, que fosse possível respeitar o meio ambiente utilizando corretamente a propriedade e seus recursos naturais e com isso gerar riqueza.
Essa é a lógica de princípios constitucionais que num primeiro momento podem até parecer contraditórios, ou seja, eles não devem colidir e sim se harmonizar. Quando eles existem em conjunto significa que eles devem ser harmonizados. Como todas as questões acima referidas podem gerar divergências de interpretações, o legislador infraconstitucional fez leis que regem essa coexistência. Assim, fica claro que um princípio (defesa do meio ambiente ou livre iniciativa) nunca estará acima do outro. A coexistência desses gera o chamado desenvolvimento sustentável (que é em suma o que a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente já previu em 1981 em seu art. 4o.).
Pois bem, infelizmente, quando quer se defender sempre a prevalência de um princípio sobre os demais, os servidores de órgãos ambientais ou de desenvolvimento econômico ou os operadores do direito (membros do MP, juízes ou advogados) acabam por ferir as leis, sejam as de procedimento, sejam as de direito material. Nada mais nefasto para o Estado Democrático de Direito. Um Estado só é justo quando as suas leis são aplicadas corretamente, independente de quem seja o sancionador, o sancionado e a matéria de fundo.
Infelizmente na matéria ambiental não é incomum se deparar com situações em que princípios e pseudo princípios se sobrepõem às normas positivadas e opiniões, percepções, crenças ou ideologias acabam prevalecendo sobre essas mesmas normas. Isso gera a conhecida insegurança jurídica, causadora de tantos males.
Nesse sentido, de todo louvável são decisões como esta do IBAMA, que lastreada em parecer jurídico[2] de um de seus renomados procuradores à época – Eduardo Fortunato Bim (atual Presidente do órgão) – anulou decisão interna que feria regramento expresso da Lei Federal 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo). O IBAMA havia feito a chamada “revisão administrativa” e com isso anulado uma decisão administrativa transitada em julgado que havia anteriormente anulado um auto de infração. Essa possibilidade afronta expressamente o art. 56 da lei, em especial seu parágrafo único que diz que “da revisão do processo não poderá resultar agravamento da sanção”.
Não se está aqui a analisar se essa decisão administrativa que havia sido revista estava certa ou não, está-se sim, louvando o fato de que algo expressamente proibido pela lei que rege a matéria havia sido feita e que a Procuradoria Jurídica do órgão determinou que a lei fosse seguida. Pode parecer pouco, mas o parecer foi acatado pelo então Procurador–Chefe Nacional da AGU – Cleiton Cursino Cruz – tornando-se assim um excelente precedente.
O que gerará um Estado Democrático de Direito sensato e equilibrado não são opiniões, crenças e ideologias preservacionistas ou desenvolvimentistas, será sim, a segurança jurídica que os que utilizarão os recursos naturais na forma permitida pela legislação terão com mais decisões como a do IBAMA que foi objeto de comentário neste sucinto artigo. As futuras gerações agradecem!
_______________________________
[2] Parecer n. 00106/2017/COJUD/PFE-IBAMA-SEDE/PGF/AGU
Por Marcos Saes
Publicado em: 12/04/2019
Cadastre-se para receber nossa newsletter e fique a par das principais novidades sobre a legislação ambiental aplicada aos diversos setores da economia.