A insegurança jurídica é um tema bastante tratado em nossa Newsletter: sua reiterada ocorrência é tamanha que nos parece um dever abordá-la. Não há dúvidas de que tal insegurança é uma das principais preocupações dos empresários que investem e pretendem investir no Brasil nos dias de hoje. Por resguardo, muitos chegam a levantar as decisões judiciais acerca de assuntos estratégicos na região em que pretendem investir, a fim de verificar precedentes, para então realizar tomadas de decisões sobre um determinado negócio.
Muitas destas situações ocorrem em conflitos de decisões de órgãos públicos municipais e de seus pares à esfera federal.
Um dos temas mais preocupantes nesse contexto se refere aos limites a serem observados para as áreas de preservação permanente (APP) de reservatórios d´águas artificiais, marcados pela sistemática trazida pelo novo Código Florestal (Lei n. 12.651/12) e aquela da Resolução CONAMA 302/2002, editada para regulamentar o Código Florestal de 1965. Em que pese em nosso entendimento tenha a nova norma revogado a antiga, como abordamos no artigo “As Apps dos Reservatórios de Águas Artificiais e o Novo Código Florestal: O que prevalece?”, muitos ainda defendem a aplicação da Resolução CONAMA em detrimento da nova lei.
Sobre o assunto, em recente decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), a 3ª Turma negou provimento à apelação do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), que embargou e expediu auto de infração em face de um condomínio, por intervenção em área de preservação permanente (APP) situada à margem de reservatório artificial de uma usina hidrelétrica (Apelação n. 0020727-38.2017.4.03.9999).
Para o IBAMA, os proprietários de lotes localizados ao redor de reservatórios artificiais estariam obrigados, desde 1965, a preservar e reflorestar na íntegra a sua área de entorno, adaptando-se às regras definidas pelas Resoluções do CONAMA. Além disso, alegou o órgão que o Município deveria observar a legislação federal referente à proteção ambiental, de modo que o parcelamento de solo já implicaria, por si só, ofensa à legislação ambiental de regência.
Prevaleceu, no entanto, a concepção de que se tratava de imóvel localizado em área urbana, nos termos da lei municipal, incabível, assim, a aplicação da segunda parte do disposto no inciso I, do art. 3º, da Resolução CONAMA n. 302/2002, que impõe afastamento de 100 (cem) metros.
Ao nosso ver, o Tribunal acertadamente aplicou a regra e fez valer a competência municipal para dispor sobre o uso do solo, entendendo que “compete ao Município definir o que compõe a área urbana, e não ao Conselho Nacional do Meio Ambiente, menos ainda por ato infralegal, exigindo-se para tanto a edição de lei em sentido estrito”.
Com efeito, concluiu a Corte Federal, “se a atuação municipal, ao autorizar e regulamentar o condomínio e reconhecê-lo em local de área urbana, incorreu em inconstitucionalidade ou ilegalidade, cabe ao IBAMA postular tal reconhecimento em ação própria, em que figure o Município no polo passivo como parte competente para a defesa dos atos impugnados, não se admitindo que a autarquia, sem providenciar tais medidas prévias, despreze lei municipal, que se presume válida e constitucional, para atingir diretamente o embargante, devidamente respaldado”.
Assim, tendo restado comprovado que o empreendimento está localizado em perímetro urbano, sendo alvo inclusive do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU), não se pode aplicar a restrição de 100 metros, própria às áreas rurais.
Lamentavelmente, contendas como a referida ainda compõem cenário muito comum no cotidiano de quem empreende no Brasil. Assuntos que poderiam ser resolvidos na seara administrativa acabam, muitas vezes, sendo judicializados e discutidos por anos no Poder Judiciário.
Por Alexandre Couto
Publicado em: 27/11/2017
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