Setor financeiro adere à economia de baixo carbono

Primeiro foi o setor de energia, que começou a direcionar seus investimentos para escolhas limpas e renováveis no mundo. Agora é o setor financeiro que puxa a narrativa da economia de baixo carbono. Esse é o lado mais efervescente de Le Bourget, onde acontece a Conferência do Clima das Nações Unidas, a CoP-21: o mercado financeiro faz mais barulho que as organizações ambientalistas.

Diariamente, em Paris, engrossa a lista de anúncios de bilhões de dólares indo de investimentos em combustíveis fósseis para algum lugar de economia limpa. É difícil rastrear tudo o que está acontecendo, e em qual proporção.

Alguns dos anúncios se referem a empresas querendo desistir gradualmente de seus investimentos em combustíveis fósseis. Boa parte diz que irá analisar sua carteira de investimentos para entender quanto está alocado em gás, carvão ou petróleo. Outros anunciam metas de ter mais energia renovável em lojas e fábricas. São sinais concretos de que a descarbonização da economia está em curso.

Uma das iniciativas, por exemplo, é a do Portfolio Descarbonization Coalition (PDC), promovida pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e o Carbon Disclosure Project (CDP), que trabalha com inventários de empresas sobre emissões de gases-estufa. O Portfolio surgiu em setembro de 2014, com a meta de atrair investidores que se comprometessem em afastar gradualmente sua carteira de investimentos dos combustíveis fósseis. O objetivo era chegar a um compromisso de US$ 100 bilhões em 2020.

Ontem, em Paris, o PDC anunciou que tem 25 grandes investidores comprometidos com US$ 600 bilhões em ativos sob gestão e anunciou mais dois membros, o grupo de seguros Allianz e o grande fundo de pensão holandês ABP.

“Nosso conhecimentos em análise de riscos, em ter resiliência financeira e em horizontes de investimentos de longo prazo nos torna capazes de oferecer um apoio mais eficiente em proteção climática”, disse Oliver Bäte, CEO da Allianz.

“Está ocorrendo uma mudança de cultura. Há dois anos, ninguém ligava para risco climático no setor financeiro. Era impossível ter essa discussão”, diz o ex-ministro de Desenvolvimento francês Pascal Canfin, hoje conselheiro de clima do think tank americano WRI. “É tudo muito novo, mas o que está acontecendo mostra claramente que a mudança do clima começa a ocupar lugar central no mainstream da economia.”

“Não olhei os últimos números, mas a magnitude dos investimentos que estamos vendo aqui, de descarbonização de portfólio de investimentos, indica que as instituições financeiras estão olhando para o mercado com outras lentes”, disse Achim Steiner, diretor executivo do Pnuma.

“Mais de 70% das reservas de combustíveis fósseis conhecidas têm que ficar no solo”, disse ao Valor Mark Campanale, sócio-fundador da Carbon Tracker Initiative, think tank baseado em Londres e que analisa os investimentos financeiros de empresas.

“Os investidores respondem a esse movimento de duas formas. Buscam desinvestir seus recursos em fósseis ou analisam seus portfólios e usam sua influência para convencer o board de empresas com as quais trabalham a sair de lá”, afirma Campanale.

Segundo a ONG 350.org, que está à frente da campanha de desinvestimento em fósseis, mais de 500 instituições representando mais de US$ 3,4 trilhões se comprometeram de alguma forma em afastar seus investimentos dos combustíveis poluentes.

“Vamos triplicar investimentos na economia de baixo carbono”, disse Henri de Castries, presidente da seguradora francesa Axa.

A Axa é uma das empresas da iniciativa conhecida por Montreal Carbon Pledge, onde 120 investidores que representam US$ 10 trilhões estão comprometidos em reduzir sua pegada de carbono.

O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) também lançou programa de apoio a emissões de “green bonds”, títulos de dívida dedicados a promover eficiência energética na América Latina. O BID vai colocar até US$ 450 milhões na iniciativa.

A multiplicidade de promessas, intenções, planos ou investimentos concretos que surgem na CoP-21, em paralelo às salas onde se concentram os negociadores, também se traduz na plataforma das Nações Unidas conhecida por Lima-Paris Action Agenda.

Ali, empresas, bancos, indústrias, entidades e governos locais divulgam suas ações em energias renováveis, transportes limpos ou novas ideias. O placar já contabiliza 10.773 compromissos, e o número continua a crescer.

“Se realmente se quiser resolver a mudança do clima, as emissões de gases-estufa têm que ser reduzidas a zero”, diz o cientista Niklas Höhne, do NewClimate Institute, com sede em Colônia, na Alemanha. “A questão é: quanto mais cedo, menos aquecimento.”

“Qual o sinal que a CoP-21 vai dar aos investidores?”, pergunta Kumi Naidoo, chefe do Greenpeace Internacional. “Se você diz que a meta de longo prazo do acordo é descarbonizar a economia em 2100 e não 2050, o que está se dizendo para os investidores é: ‘você tem tempo para queimar carbono'”, continua.

“O que queremos em Paris é mostrar que este é o fim da era dos combustíveis fósseis e mover o mundo dos negócios para energia limpa.” E emenda: “Essa transição está ocorrendo e vai continuar, de qualquer maneira. Trata-se de um movimento irreversível na economia”, aposta.

Fonte: Valor Econômico

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