Não bastasse o freio nas atividades do setor de óleo e gás no Brasil por causa dos escândalos de corrupção envolvendo a Petrobras, as duas últimas rodadas de petróleo feitas pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) para exploração de áreas sob o regime de concessão vivem momento de impasse e atrasos. Em parte dos blocos arrematados em 2013, questionamentos ambientais travam o cronograma original de desenvolvimento dos projetos.
Na 11ª rodada, de maio de 2013, o impasse está localizado na Margem Equatorial, área entre Rio Grande do Norte e Amazonas permeada de espaços de conservação. Para que as empresa iniciem as atividades sísmicas nos blocos em alto-mar, o Ibama exige uma série de condicionantes ambientais. Resultado: dos 172 blocos arrematados no leilão, que incluiu outras áreas, 45 estão atrasados. Dos R$ 6,9 bilhões em investimentos obrigatórios totais previstos na fase exploratória, R$ 4,2 bilhões mal saíram do papel.
Já na 12ª rodada, de novembro de 2013, voltada para a exploração de blocos em terra, a possibilidade de descoberta de shale gas (gás não convencional) nas bacias de Paraná, Recôncavo (BA) e Parnaíba (PI) foi travada por decisões judiciais a pedido do Ministério Público Federal (MPF). A alegação é que não são conhecidos os impactos sociais e ambientais da tecnologia de exploração do shale gas. Dos 72 contratos da rodada, 47 tiveram de ser suspensos e, em alguns casos, cancelados pela ANP, que teve de abrir mão de R$ 389 milhões em investimentos mínimos.
— O setor de óleo e gás já está sofrendo com todas as questões envolvendo a Petrobras. Agora, as duas rodadas estão enfrentando questionamentos, o que pode inviabilizar o desenvolvimento dessas áreas devido aos custos das condicionantes. O cenário é de incerteza, e as companhias têm de ficar com os recursos (dinheiro) alocados — explica Alexandre Sion, da Sion Advogados.
MAIOR MANGUEZAL DO MUNDO
Especialistas dizem que a Margem Equatorial, da 11ª rodada, é desconhecida. Por isso, o Ibama exige estudos de monitoramento de praias, atividade de pesca e de cetáceos, e a dispersão de larvas de lagostas. Para Oscar Couto, da Lobo & Ibeas Advogados, os estudos levam tempo para coleta:
— As exigências surgiram pela falta de conhecimento da área. Segundo estimativas, o custo de sísmica por empresa subiu de R$ 500 mil para R$ 2,5 milhões.
O Ibama diz que espera receber a maior parte dos estudos ainda no primeiro trimestre. Entre as empresas, a Total — que arrematou áreas na Bacia do Foz do Amazonas — disse que trabalha em cooperação com o Ibama para que as licenças sejam concedidas em prazos que viabilizem o cumprimento das atividades previstas para cada área. A Petrobras, com diversos blocos na região, afirmou que mantém diálogo rotineiro com Ibama e ANP. Outras empresas que arremataram áreas na 11ª rodada, como BP, BG e Queiroz Galvão, não se pronunciaram.
Simone Paschoal Nogueira, da Siqueira Castro Advogados, elogia a decisão do Ibama. Ela lembra que a Margem Equatorial, que não conta com estudos ambientais, tem o maior manguezal do mundo, entre Pará e Maranhão. Porém, diz que não podem ser exigidas todas as informações ambientais durante o processo de obtenção de licença:
— As empresas de petróleo não podem mais minimizar a questão ambiental. Por isso, os trabalhos na rodada estão atrasados. A 12ª rodada está suspensa, já que não foi feito, por parte do governo, estudo ambiental das bacias sedimentares, como prevê a regulamentação.
Já a 12ª rodada é alvo de quatro ações do MPF de cidades do Paraná, São Paulo, Bahia e Piauí. Os procuradores alegam que o governo não fez a Avaliação Ambiental de Áreas Sedimentares (AAAS) demonstrando a viabilidade do uso da técnica de fraturamento hidráulico no país, que prevê grandes quantidades de água e aditivos químicos. Nas ações de Paraná, Bahia e Piauí, a Justiça atendeu o pleito do MPF e proibiu a exploração. Em São Paulo, não há decisão. Os autos do processo foram remetidos à Procuradoria-Geral Federal, responsável pela defesa da ANP, que é ré no processo ao lado das empresas que compraram os blocos.
— A exploração do gás pela técnica de fraturamento sem os estudos poderá causar danos ambientais irreversíveis. O leilão ocorreu de forma prematura e sem a devida informação. Existem áreas consideradas de alta vulnerabilidade e risco de poluição na região. Os blocos exploratórios estão inseridos no Sistema aquífero Guarani (maior reserva de água doce do mundo) — disse Luís Roberto Gomes, procurador em Presidente Prudente (SP).
PARA ANP, NÃO HÁ ATRASO
Ana Luci Grizzi, sócia da área ambiental do Veirano Advogados, diz que continua pendente a publicação de norma sobre requisitos ambientais (incluindo licenciamento) para uso da técnica de fraturamento hidráulico no país. Ela destaca que, com a situação ambiental indefinida e sem a AAAS para as regiões, o investidor é prejudicado:
— As questões ambientais não são impasse. O impasse é criado, pois não conseguimos fazer nosso país funcionar com a questão ambiental integrada ao desenvolvimento econômico.
Para o Ministério de Minas e Energia, o instrumento apropriado para o estudo das áreas é o licenciamento ambiental, não a AAAS. Além disso, destaca que opera em conjunto com Ibama e ANP. Com relação às ações judiciais, a Petrobras disse que “posterga a implementação do programa de trabalho planejado logo após a assinatura do contrato”. A Petra, que comprou blocos no Paraná, informou que, neste momento de insegurança jurídica, os investimentos mais relevantes serão necessariamente postergados.
A ANP disse que só foram suspensas atividades nas áreas com potencial de shale gas (gás não convencional), com fraturamento hidráulico, até que haja regulamentação do Conama (grupo interministerial) sobre a técnica, bem como a avaliação ambiental das áreas. A agência frisou ainda que as rodadas não estão atrasadas.
Por: Bruno Rosa e Ramona Ordoñez
Fonte: O Globo
Confira ainda o Mapa dos Entraves (ANP), com as áreas dos dois últimos leilões que enfrentam problemas.
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