Supressão de vegetação e corte de árvores isoladas na Mata Atlântica

Conciliar a proteção do meio ambiente com o progresso urbano-científico é o grande paradigma do século XXI, o que é espelhado nas legislações mais modernas. A permissão para suprimir vegetação, por exemplo, é sempre em último caso, em estritas circunstâncias, e sempre acompanhada de condicionantes.

A supressão de vegetação, que pode incluir diversas árvores e outras formas de vida vegetal, servirá para permitir o desenvolvimento de atividades humanas naquela área específica, como a agricultura, pecuária ou edificações urbanas.

A Lei da Mata Atlântica é um modelo significativo dessa busca conciliatória. Como disposto no art. 1º, sua finalidade é garantir a conservação, a proteção, a regeneração e a utilização do Bioma por ela regido. Ao olhar desavisado, parece conflitante a busca simultânea pela proteção e utilização do Bioma mas, na prática, regular o uso é garantir a proteção.

Uma das formas de utilização é a possibilidade de realizar a supressão de vegetação, dependendo do estágio sucessional que se encontra, para fins de edificação urbana, e desde que sejam resguardados percentuais da área total vegetada (30% ou 50%). Além disso, a norma impõe a compensação da mesma extensão da área suprimida em outra localidade e com as mesmas características vegetais[1].

Tratando-se do Bioma Mata Atlântica, contudo, nem sempre a regra geral será aplicada. Uma exceção é o chamado corte de “árvores isoladas”, conceito empregado na remoção de exemplares arbóreos que não estão integrados a um grupo maior de vegetação, quer dizer, que se encontrem literalmente isolados em determinada área, sem interagir com o meio biótico.

Este processo de remoção pode ser necessário por várias razões, incluindo gestão de paisagem, segurança ou até mesmo pela saúde do exemplar arbóreo envolvido, cujo procedimento também está sujeito à regulamentações específicas, dependendo da localização e do tipo de árvore, isto é, se não possui proteção legal específica.

Em Santa Catarina, a Instrução Normativa do IMA n. 57/2019 regula o corte de indivíduos arbóreos isolados em áreas urbanas ou rurais para fins agrossilvipastoris, definindo-os como sendo:

aqueles situados fora de fisionomias vegetais nativas, cujas copas ou partes aéreas não estejam em contato entre si, destacando-se da paisagem como indivíduos isolados. Não é possível identificar a presença de estratos, não há acúmulo significativo de serrapilheira, nem diversidade de epífitas ou presença de lianas lenhosas, o que não permite o enquadramento técnico como fragmento florestal nativo, independentemente de número e espécies em sua composição. (grifo nosso)

A normativa também prevê um sistema de compensação, como ocorre com a supressão de vegetação da Lei da Mata Atlântica. A compensação de árvores em áreas rurais, por exemplo, deverá ser de dez para um, isto é, para cada indivíduo derrubado, dez indivíduos da mesma espécie deverão ser plantados na mesma propriedade[2].

Já no estado de São Paulo, o corte de indivíduos isolados e o sistema de compensação são regulamentados pela Resolução SEMIL 02/2024 e pela Decisão de Diretoria 67/21. Importa ressaltar que, tratando-se do corte de indivíduos isolados em lotes urbanos, ou fora de áreas ambientalmente protegidas, a autorização deverá ser concedida pelo órgão municipal competente, com base na Deliberação Consema 01/2024.

Em síntese, ambas as atividades são regulamentadas por leis e atos administrativos e, na maioria dos casos, exigem autorizações dos órgãos ambientais competentes, que serão concedidas por meio de um sistema de compensação predefinido. Por isso é sempre fundamental consultar os órgãos públicos e uma assessoria jurídica especializada antes de praticar qualquer tipo de intervenção em espécies arbóreas.


[1] Art. 17. O corte ou a supressão de vegetação primária ou secundária nos estágios médio ou avançado de regeneração do Bioma Mata Atlântica, autorizados por esta Lei, ficam condicionados à compensação ambiental, na forma da destinação de área equivalente à extensão da área desmatada, com as mesmas características ecológicas, na mesma bacia hidrográfica, sempre que possível na mesma microbacia hidrográfica, e, nos casos previstos nos arts. 30 e 31, ambos desta Lei, em áreas localizadas no mesmo Município ou região metropolitana.

Art. 30. É vedada a supressão de vegetação primária do Bioma Mata Atlântica, para fins de loteamento ou edificação, nas regiões metropolitanas e áreas urbanas consideradas como tal em lei específica, aplicando-se à supressão da vegetação secundária em estágio avançado de regeneração as seguintes restrições:

I – nos perímetros urbanos aprovados até a data de início de vigência desta Lei, a supressão de vegetação secundária em estágio avançado de regeneração dependerá de prévia autorização do órgão estadual competente e somente será admitida, para fins de loteamento ou edificação, no caso de empreendimentos que garantam a preservação de vegetação nativa em estágio avançado de regeneração em no mínimo 50% (cinqüenta por cento) da área total coberta por esta vegetação, ressalvado o disposto nos arts. 11, 12 e 17 desta Lei e atendido o disposto no Plano Diretor do Município e demais normas urbanísticas e ambientais aplicáveis;

II – nos perímetros urbanos aprovados após a data de início de vigência desta Lei, é vedada a supressão de vegetação secundária em estágio avançado de regeneração do Bioma Mata Atlântica para fins de loteamento ou edificação.

Art. 31. Nas regiões metropolitanas e áreas urbanas, assim consideradas em lei, o parcelamento do solo para fins de loteamento ou qualquer edificação em área de vegetação secundária, em estágio médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, devem obedecer ao disposto no Plano Diretor do Município e demais normas aplicáveis, e dependerão de prévia autorização do órgão estadual competente, ressalvado o disposto nos arts. 11, 12 e 17 desta Lei.

§ 1º Nos perímetros urbanos aprovados até a data de início de vigência desta Lei, a supressão de vegetação secundária em estágio médio de regeneração somente será admitida, para fins de loteamento ou edificação, no caso de empreendimentos que garantam a preservação de vegetação nativa em estágio médio de regeneração em no mínimo 30% (trinta por cento) da área total coberta por esta vegetação.

§ 2º Nos perímetros urbanos delimitados após a data de início de vigência desta Lei, a supressão de vegetação secundária em estágio médio de regeneração fica condicionada à manutenção de vegetação em estágio médio de regeneração em no mínimo 50% (cinqüenta por cento) da área total coberta por esta vegetação.

[2] 4.5 A compensação pelo corte das árvores isoladas deverá atender aos critérios estabelecidos abaixo:

a. A compensação em área rural deverá se dar por meio de comprovação de plantio, na propriedade, de 10 (dez) mudas da mesma espécie das árvores cortadas, com altura total igual ou maior do que 50 cm;

Publicado em: 14/10/2024

Por: Caio Henrique Bocchini

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