Em toda ação judicial, a regra geral sobre a obrigação de provar é que cada um deve provar o que alega. Assim, quando faltam provas no processo, o juiz deve decidir contrariamente a quem tinha obrigação de provar e não provou. Essa é a regra da distribuição estática do ônus da prova.
A partir da vigência do novo Código de Processo Civil, em 2015, surgiu uma novidade nesse assunto. Agora, quando o juiz entender que a regra geral não é suficiente, ele pode atribuir o ônus de provar para a parte que pode provar, aquela que tem melhores condições de produzir a prova – seja porque tem acesso a documentos ou ao local dos fatos, porque tem mais condições técnicas de fazer a perícia, etc. Essa é a distribuição dinâmica do ônus da prova.
Assim, é possível distribuir as provas entre as partes, de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto. E esse último conceito é chave: essa distribuição dinâmica não é uma regra pré-existente. Ela deve ser aplicada pelo juiz a cada caso, de acordo com a situação concreta de cada processo, para evitar que alguma das partes acabe sendo onerada com a obrigação de produzir prova impossível.
O que tem isso a ver com o direito ambiental? Tudo. Em 2018, analisando o impacto dessa nova regra sobre as ações que versam sobre direito ambiental, o STJ caminhou na contramão. Por meio da súmula 618, o Tribunal consolidou o entendimento de que “a inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental.”
A redação da súmula não fala em distribuição dinâmica nem em distribuição estática, mas em inversão do ônus da prova. Essa é um terceiro tipo de regra sobre prova, geralmente aplicada em ações movidas por consumidores contra grandes empresas, segundo a qual cabe ao réu provar a inexistência dos fatos alegados pelo autor. Uma distribuição estática, mas invertida.
O problema está em aplicar essa mesma lógica para todas as ações de degradação ambiental, indistintamente. Quando o empreendedor sofre uma ação porque supostamente causou danos ao meio ambiente, ele passa a assumir a responsabilidade por provar que o dano não aconteceu. Ou seja, se nada for provado, o juiz presumirá que houve dano ambiental.
Isso coloca o empreendedor em posição de enorme desvantagem em qualquer ação judicial que trate de danos ambientais. Na prática, o jogo já começa perdido e precisa ser virado durante o processo.
Quer dizer, no afã de adequar-se ao novo Código de Processo Civil e de efetivar a proteção ao meio ambiente (que são objetivos nobres), o STJ acabou indo longe demais, contrariando a regra da distribuição dinâmica do ônus da prova para dizer que o ônus de provar é sempre do empreendedor, independentemente das circunstâncias do caso concreto.
Esse entendimento precisa ser revisto. As ações ambientais devem seguir a regra geral da lei: distribuição estática nos casos normais e, excepcionalmente, a distribuição dinâmica. Não há base legal para inverter o ônus da prova em toda e qualquer ação que trate sobre degradação ambiental.
Até lá, porém, esse entendimento do STJ serve como mais uma razão para fazer valer a velha máxima de que é melhor prevenir do que remediar. A melhor ação judicial é aquela que nunca é ajuizada. Mas, se o indesejável acontecer, é importante que o empreendedor esteja preparado e devidamente assessorado na parte técnica e jurídica, para que a prova não acabe se tornando impossível.
Publicado em: 15/09/2020
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