22/01/2020
Por Henrique Cisman
Elaborada pela equipe econômica do governo federal, a medida provisória 881, mais conhecida como MP da Liberdade Econômica, foi convertida em Lei Federal pelo Congresso em agosto do ano passado. Com o número 13.874/2019, o dispositivo começou a vigorar em setembro, após ser sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro e publicado no Diário Oficial da União.
Além de alterar aspectos do Direito do Trabalho e do Direito Civil, a legislação impacta diretamente o setor imobiliário, tentando colocar fim a dificuldades comumente enfrentadas pelos empreendedores. Dentre as mudanças, a mais significativa consiste na aprovação tácita das solicitações de atos públicos de liberação da atividade econômica, isto é, das licenças e alvarás necessários para a atividade de construção civil.
“Para executar um projeto [imobiliário] é preciso aprovação da prefeitura. O empreendedor apresenta esse projeto e não necessariamente há um prazo pré-estabelecido para análise. Com essa disposição legal, ele pode exigir da administração pública um prazo para dar a resposta. Expirado esse prazo, pressupõe-se que a documentação e os atos que se pretendem praticar estão em consonância com a legislação municipal”, explica o advogado especialista em direito imobiliário Alberto Pequeno, do escritório Dias & Amaral.
Outro especialista no tema, o advogado Mateus Stallivieri, do escritório Saes Advogados, ressalta que o dispositivo não se sobrepõe a outras normas do ordenamento jurídico brasileiro por força da previsão do próprio Artigo 3º da Declaração. Como exemplo, é possível citar a Lei Complementar nº 140 (licenciamento ambiental), que veda autorização tácita em seu artigo 14, §3º.
“A Lei da Liberdade Econômica se aplica, a princípio, nas diferentes formas de licença, autorização e atos de liberação previstos no Artigo 1º, §6, exceto se houver previsão na legislação específica de que isso não aconteça”, afirma.
Ainda de acordo com Stallivieri, essa interpretação ampliada da Declaração, que se retira da leitura dos dispositivos, deve sofrer questionamentos judiciais futuros, principalmente no tocante a atos complexos, concessões, procedimentos bilaterais ou que permitam condicionantes.
Quais são os prazos para análise?
Os prazos mencionados pela Lei 13.874/2019 não constam em seu texto. “Esse prazo é sugerido pela empresa [incorporadora, loteadora ou construtora] e a administração pública pode recusar. Ele é um consenso entre as partes e deve ser registrado no ato da solicitação do alvará. Há prefeituras que já têm prazos definidos, mas dentre os mais de 5 mil municípios no Brasil, cada um faz de uma forma”, esclarece Pequeno.
O especialista conta que conhece casos de projetos de loteamentos que ficaram mais de dois anos aguardando análise da administração pública. Para Stallivieri, a lei carece de algumas regulamentações: “Eu entendo que são necessárias regulamentações específicas em nível municipal e estadual para que cada administração determine os procedimentos em cada tipo de licença”, afirma.
Importante destacar que apesar da possibilidade de aprovação tácita inicial, o empreendimento permanece passível de fiscalizações no decorrer do projeto: “A lei [da Liberdade Econômica] não vai impedir qualquer tipo de autorização específica que o município ou o estado venham a exigir”, ilustra Stallivieri.
Dispensa de alvarás não abarca construção civil
A lei 13.874/2019 dispensa a necessidade dos atos públicos de liberação para atividades econômicas de baixo risco. Na resolução do CGSIM (Comitê para Gestão da Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios), a construção civil não consta – de maneira alguma – como atividade de baixo risco ou baixo risco A, para as quais são permitidas tal dispensa.
“Pode ser que para algum empreendimento de metragem menor, ou do segmento econômico, como o Minha Casa, Minha Vida, seja enquadrado [futuramente], pois, atualmente, não é”, confirma Pequeno.
Digitalização de documentos e inovações tecnológicas
A Lei da Liberdade Econômica determina que qualquer documento pode ser arquivado em meio digital, equiparando-se “a documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato de direito público”. Para as empresas, sejam elas do setor imobiliário ou de outro, a medida permite ganhar espaço e reduzir custos com armazenamento de papéis.
O especialista Alberto Pequeno ressalta que os registros de imóveis ainda precisam ocorrer no respectivo cartório da circunscrição de cada unidade. “O que a lei permite, por exemplo, é que se faça um contrato de promessa de compra e venda, ou contrato de locação, e ao invés de ele existir fisicamente, pode existir só virtualmente”, acrescenta.
Finalmente, o dispositivo pode ser instrumento de argumentação para empresas tecnológicas quando em litígios judiciais. Isso porque, em seu Art. 3º, inciso VI, a lei autoriza “desenvolver, executar, operar ou comercializar novas modalidades de produtos e de serviços quando as normas infralegais se tornarem desatualizadas por força de desenvolvimento tecnológico consolidado internacionalmente”.
Segundo Pequeno, trata-se de casos como o Airbnb: “Um aplicativo que se desenvolveu para a locação por temporada (que é prevista na Lei de Locação), mas que tem contornos próprios: não existe contrato físico nem pagamento de corretagem, que são comuns na locação por temporada. O Airbnb é o melhor exemplo disso aplicado ao mercado imobiliário”, encerra o especialista.
Fonte: Smartus
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