Um Terminal de Uso Privado (TUP) pode ser implantado onde há vegetação de Mata Atlântica?

Antes que o leitor se assuste, a resposta é sim. Um TUP pode sim ser implantado no Bioma Mata Atlântica e, por consequência, suprimir vegetação para isso – evidentemente desde que realize a devida compensação ambiental pela supressão (para saber mais sobre compensação, confira nosso artigo “Se cortar vegetação de Mata Atlântica, tem que compensar”) .

E por que uma resposta negativa à pergunta do título seria “de assustar”? Porque significaria dizer que, ao se pensar em todo o litoral leste do Brasil, em tese só caberiam TUPs – com o perdão do trocadilho – ao sul no Rio Grande do Sul (Bioma Pampa) e ao norte no Rio Grande do Norte (Bioma Caatinga).

Os estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco e Paraíba têm todo o seu litoral situado no Bioma Mata Atlântica. Se a resposta ao título fosse não, a consequência seria a de esses 10 estados serem impossibilitados de receberem Terminais de Uso Privado (TUPs) – tendo de limitar suas eventuais atividades portuárias aos Portos Organizados (bens eminentemente públicos, expressões de uma inclinação estatista que hoje em dia é sabiamente enxergada com ponderação).

Pela Lei da Mata Atlântica (Lei Federal n. 11.428/2006), uma das hipóteses a autorizar supressão de vegetação especialmente protegida desse Bioma consiste na utilidade pública. Dentre outras atividades, a Lei considera de utilidade pública “as obras essenciais de infraestrutura de interesse nacional destinadas aos serviços públicos de transporte, declaradas pelo poder público federal ou dos Estados”.

Em que pese se ter conhecimento de decisões judiciais no Brasil em que os(as) juízes(as) não consideraram os TUPs como de utilidade pública, entende-se que esse tipo de projeto claramente enquadra-se sim no conceito de utilidade pública da Lei da Mata Atlântica.

É inegável que, em um país como o Brasil que tanto tem a crescer e que apresenta tamanha dotação para o desenvolvimento portuário, um TUP consiste em obra essencial de infraestrutura de interesse nacional. Além disso, destina-se ao serviço público de transporte porque não se limita à movimentação de cargas próprias e opera mediante autorização do Poder Público (conforme o art. 21, XII, f, da Constituição da República, compete à União – caráter público, portanto – explorar os portos marítimos, seja diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão).

Assim, conclui-se que a resposta ao título deste breve artigo é sim. Desde que se observe a legislação (inclusive quanto à necessidade de declaração de utilidade pública – DUP, conforme já escrevemos em “Conheça o DUP”), não há vedação legal para a implantação de um TUP no Bioma Mata Atlântica. Reitera-se que ao se responder não à pergunta do título, além de se interpretar incorretamente a Lei, na prática basicamente inviabiliza-se a implantação de TUPs no litoral leste do Brasil.

Por Nelson Tonon Neto

Publicado em: 19/03/2018

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