Nem sempre o princípio da precaução justifica a urgente interferência judicial

O longo trâmite de ações judiciais por vezes pode tornar ineficaz a medida solicitada pelo detentor de um direito. Por isso, é possível que medidas provisórias sejam determinadas para assegurar ou antecipar o resultado útil do processo. Mas quando a tutela de urgência pode ser concedida?

Prevê o artigo 300 do Código de Processo Civil que a tutela provisória, ferramenta capaz de assegurar a efetividade do direito pretendido ou antecipar o provimento jurisdicional, pode ser deferida quando demonstrados dois requisitos: a) a probabilidade do direito invocado, também conhecido como fumus boni iuris; e b) o perigo em razão da demora – periculum in mora -, existente no momento em que o pedido foi realizado.

O instituto ganha grande destaque na área ambiental, em razão da importância de medidas que assegurem a preservação do meio ambiente, em detrimento da demora no desfecho das ações judiciais.

Não é diferente quando se trata de empreendimentos e atividades portuárias, cujas decisões do órgão ambiental no procedimento de licenciamento são frequentemente questionadas pelos órgãos controladores por meio da judicialização da matéria. Contudo, não raro os pedidos são desacompanhados dos requisitos necessários ao deferimento da medida.

Nesses casos, a tutela provisória deve ser indeferida. É o que entendeu por mais de uma vez o Tribunal Regional Federal da 4ª Região. A título de exemplo, na oportunidade em que a competência para o licenciamento ambiental da ampliação da capacidade operacional de terminal portuário foi questionada, decidiu-se pela ausência de risco concreto, destacando-se que ambos os órgãos ambientais indagados estavam de acordo quanto ao processamento do procedimento administrativo¹.

Em outro julgado, não acolheu o pedido do Ministério Público Federal² para suspender a validade de licenciamento ambiental. O argumento do MPF era do que as atividades portuárias relacionadas ao transporte de produtos químicos são dotadas de absoluta presunção de potencial degradação e, por isso, mesmo em casos não complexos, ensejaria a necessidade de elaboração de Estudo de Impacto Ambiental – EIA.

As decisões são importantes, pois além de reconhecerem a falta dos requisitos para a medida de urgência, reiteram o entendimento de que é inadequada a intervenção do Poder Judiciário nas questões afetas ao licenciante quando apoiada exclusivamente no princípio da precaução, sem que haja demonstração do equívoco na decisão do órgão ambiental e da necessidade da medida.

Com efeito, a tentativa de transferir atribuições que competem aos órgãos ambientais para esfera judicial quando ausentes os fundamentos que ensejam a medida de controle, consiste, a bem verdade, em afronta ao princípio basilar da separação dos poderes. Por isso, entende-se que os pedidos de urgência devem ser analisados com a devida cautela, no intuito de evitar intromissões injustificadas, sem o devido apoio legal.

¹ TRF-4, AG: 5049398-17.2016.4.04.0000

² TRF-4, AG 5009757-32.2010.4.04.0000

Por Ana Paula Sigounas Muhammad

Publicado em: 18/03/2019

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