O que muda nas questões ambientais com a aprovação da PEC das Praias?

A PEC das Praias (como ficou conhecida a PEC 03/2022) causou um alvoroço nacional. O alarde se deu muito em razão da propagação nas redes sociais de que a proposta de emenda constitucional privatizaria as praias do país, como também em razão da catástrofe resultante das chuvas ocorrida no Rio Grande do Sul, que escancarou a problemática no enfrentamento dos efeitos das mudanças climáticas nas cidades.

Apesar da PEC 03/2022 tratar especificamente da extinção dos terrenos de marinha e das faixas de segurança de nossa Constituição Federal (art. 20, VII e §3º, do art. 49 do ADCT), viu-se nos debates ocorridos na Audiência Pública realizada em maio deste ano, uma oportunidade para discutir os efeitos das mudanças climáticas e como combatê-los, os impactos do aumento da temperatura, do aumento do nível do mar, processos erosivos, ocupações irregulares e desordenadas, restrição de acesso às praias, e outros temas. Problemas atuais, mas que ao final, confundiu-se “alhos com bugalhos”.

De uma simples leitura da PEC e suas variações desde a Câmara dos Deputados (PEC 39/2011), vê-se que a proposta não altera em nada as obrigações que todos nós temos com relação à proteção ambiental. O fato de um terreno de marinha e/ou a faixa de segurança deixarem de existir não atinge as obrigações legais relacionadas às áreas especialmente protegidas, por exemplo.  A legislação ambiental (Código Florestal, Lei da Mata Atlântica, Sistema Nacional de Unidades de Conservação, dentre outros) permanece exatamente a mesma e com ela nosso dever de proteger o meio ambiente para as presentes e futuras gerações como manda a Constituição Federal (art. 225, CF). Não há que se falar, portanto, em abrandamento da legislação ambiental.

Quanto ao acesso à praia, a PEC nunca previu sua privatização. As praias são bens da União de uso comum do povo, sendo sempre assegurado livre e franco acesso a elas e ao mar (art. 20 , IV , da CF; art. 10 da Lei nº 7.661/88). A preocupação que se tem (genuína por sinal) é a de que com a privatização dos terrenos de marinha, consequentemente algumas praias sejam privatizadas. No entanto, convenhamos, tal problemática existe há muito tempo no país, e está em muito relacionada à falta de planejamento e gestão territorial. 

São inúmeros os processos judiciais retratando a questão, seja de acesso às praias e/ou sua ocupação irregular (em um breve levantamento jurisprudencial pudemos verificar mais de 6.500 processos). Cabe lembrar que o poder público municipal tem a incumbência de assegurar o acesso às praias (art. 21, §1º, do Decreto Federal nº 5.300/04) e à União imitir-se na posse de imóveis irregularmente ocupados ( art. 10 da Lei Federal nº 9.636/98). 

Empreender em áreas próximas à beira mar faz com que o empreendedor deva se atentar a  legislação ambiental, como também aos critérios de acesso à praia estabelecidos pelo poder público municipal, em conjunto com o órgão ambiental, que variam de empreendimento para empreendimento. Não se pode esquecer, ainda, que o direito de acesso também é assegurado por meio de condicionantes ambientais estabelecidas em licenças ambientais. Seu  descumprimento enseja em multas que variam de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 10 milhões de reais (art. 66, II, Decreto 6.514/2008), sem prejuízo das demais responsabilizações.

A PEC ainda aguarda votação terminativa. No entanto, as obrigações ambientais nunca deixaram de existir.

Publicado em: 02/09/2024

Por: Gleyse Gulin

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