O Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), tal qual seu antecessor (Lei n. 4.771/1965), prevê a proteção a título de área de preservação permanente de uma faixa de, no mínimo, 30 metros de largura ao longo dos cursos d’água, com vistas a preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
Ocorre que a legislação ambiental não diferencia os rios existentes nas zonas rurais daqueles presentes em áreas urbanas consolidadas, restando à Administração Pública e ao Poder Judiciário a difícil tarefa de dar solução aos problemas práticos das grandes cidades.
Usualmente construídas no entorno de rios, de modo a facilitar o acesso aos recursos hídricos pela população, as cidades se desenvolveram ao longo dos séculos – de modo mais ou menos organizado -, culminando com situações muitas vezes inaceitáveis para os padrões de proteção ambientais atuais, mas condizentes com a trajetória de formação dos núcleos urbanos. Em oposição ao ideal bucólico, representam os rios o centro da vida de muitas cidades, não sendo lógico imaginar a remoção de tudo aquilo que se concretizou ao seu redor.
Em muitas cidades ribeirinhas, as construções avançam, de forma irreversível e consolidada, rente aos cursos d’água, denotando a irrelevância e a desproporcionalidade de se exigir, nesse contexto, a observância de recuos rigorosos para as novas obras ou, pior, a demolição daquelas erigidas em conformidade com os parâmetros locais.
Não se pode desconsiderar, assim, as características de regiões onde, no interesse da coletividade e de modo a possibilitar o desenvolvimento urbano, suprimiu-se a vegetação ciliar, sob pena de sancionar condutas legitimadas ao seu tempo.
Atentos às peculiaridades dos rios urbanos, os Tribunais pátrios e órgãos ambientais vêm sensatamente decidindo pela aplicação de limitações mais condizentes com áreas de ocupação urbana consolidada do que aquelas genericamente dispostas no Código Florestal, autorizando a incidência das previsões da Lei n. 6.766/1979 (Lei de Parcelamento do Solo Urbano, que estipula recuo específico de 15 metros), de diplomas estaduais ou municipais ou mesmo outros entendimentos mais razoáveis frente ao caso concreto.
Deve preponderar, acima de tudo, o bom senso, envidando recursos e esforços para evitar a clandestinidade e os processos de favelização que assolam os centros urbanos, ao invés de instituir cenário de insegurança jurídica e combater situações plenamente adequadas ao seu contexto.
Por Beatriz Campos Kowalski
Publicado em: 21/03/2017
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